sábado, 22 de abril de 2017

Medo e dependência

“Povo Superior” foi um rótulo de emancipação do ilhéu para ganhar auto-estima e confiança, colocando assim o “mundo” insular no mapa nacional. Por doses cavalares no discurso político, tornou-se um entrave ao próprio crescimento desse Povo que vagueou pelo convencimento sem tino na comparação e na dimensão, logo no discernimento. Viviam a contento com o título enquanto alguns se serviam dele.

O Povo Superior tem falhas graves e necessita de um “upgrade” que corrija o medo e a dependência. Mais do que um peito cheio, necessitamos de uma sociedade corajosa e livre dos esquemas da política, onde se incute o medo de perder, de estar privado ou dependente de sustento perante uma aprovação que atrofia a vida. Estamos numa região demasiado politizada onde a decadente classe política concebeu um sistema que usa o expediente para obter o pedido de cunha que, assim, lhes credita um favor a cobrar, o voto. Os políticos que não convencem pelo discurso usam a manipulação dos medos e das dependências para comprar os eleitores pela necessidade.

Uma nova emancipação pode agora integrar o ilhéu no mundo. Se mantiver o medo, será ilha, viverá uma vida condicionada pela cleptocracia que anula os seus sonhos. A emancipação usará a democracia para se dar ao respeito. Ou pensa como ilhéu ou pensa como parte do mundo. O episódio mundial do busto disse-nos que os esquemas da fórmula regional de sucesso não obtém resultados extra ilha. Tivemos publicidade, sim, negativa. Se insistirmos, passam-nos o cilindro sem contemplações ou tabus, e muito menos com medo ou dependência. E se era o Centro Internacional de Negócios? E o ferry que mandamos embora e agora não regressa? Um passo em falso e estamos marcados.

O medo, força motriz do terrorismo, é também promotor de alguma sociedade regional que pula e avança moldando a democracia, esse teatro político dito civilizado onde tudo se alcança e do qual muitos temem perder alguma coisa ou deixar de estar em estado de graça. Sucumbimos, dia-a-dia, na Autonomia XXI.

Medo é o encontro tácito entre a consciência da vulnerabilidade e a falta de raciocínio. Quem consegue dominar o medo será dono da sua vida e, por isso, é bom estar bem informado para saber lidar com as situações. Os que dominam ou desvalorizam o seu medo criam ascendente sobre os outros, muito apegados a tudo, por vezes a trivialidades que enchem a cabeça, intoxicados pela falsa importância das coisas e das gentes, em conjunturas dúbias ou empoladas do “diz que disse”. Sentir medo, mesmo que seja só apreensão, em votar, significa que o candidato dominante tomou posse do seu direito cívico e que, apesar de viver em democracia, não é livre. Se era isto que queriam referir com o “deficit democrático” foram aselhas. A única coisa que não é livre é o pensamento, o corpo vagueia. Faça como nos telemóveis, desbloqueie, caso contrário passa de eleitor a cúmplice do “tarifário”.

O medo que se apodera das pesadas estruturas governativas, com a cultura da cunha e não do mérito, faz dos indivíduos escolhidos por compadrio ou amiguismo selos de pactos de não exigência, tornando as suas instituições disfuncionais e subservientes, sem autoridade para impor regras, sendo antes um pró-forma que nos conduz a obras inconcebíveis, a falências e a fífias de gestão. Quando juram, se juram, por sua honra nas investiduras, juram a quem de facto? O medo é a nossa pequenez e resulta em dependência. É natural que os mais capazes sejam marginalizados. Deixe-se de condescendência, permissividade, tolerância e também de inércia gratuita na democracia, seja exigente. Só cresceremos, enquanto sociedade, por liberdade de pensar e agir, pelo fruir e fluir das ideias, ditas sem medo e conjugadas para o interesse de todos.

Nos Estados Unidos, a eleição do “artista” Trump, com tudo o que representa, encontra nos pilares legislativos e judiciais o garante da firmeza da democracia americana que funciona. Trump, apesar de presidente, não vai fazer tudo o que pretende. Com este raciocínio estamos de volta à pequenez da nossa Autonomia XXI. Se, e só se, tivermos um dia um governo ditador, incompetente, de situações insanas ou corrupto como seria? A Assembleia Legislativa Regional mostrar-se-ia independente e fiscalizante? Teria parlamentares fidedignos? Ou teríamos escolhidos para fazer exactamente o contrário? E o poder judicial seria imune às pressões, às proximidades e aos relacionamentos com o poder político que também lhes dá jeitos? Há separação de poderes ou comungam poderes?

A Madeira está a morrer demograficamente com a ausência de oportunidades e consequentemente de rendimento. Os poucos que nascem, formam-se para o êxodo mas ninguém está preocupado. Todos, na aflição mundana, jogam para si no imediato. O medo e a dependência no imediatismo facilitam o nosso fim e não temos qualquer plano para além do salve-se quem puder no jogo da política. Aos que só agora despertam para as duas velocidades, se não três, porque entrou na agenda política, saiba que a da Madeira é de momento uma velocidade encravada, basta ver o que sucede com o essencial e a voracidade dos que estão convencidos de que o seu mundo termina proximamente. Só temos futuro com um “upgrade” sério no povo porque no meio político, governo e oposição, estão acomodados. Oferecer jantares é capaz de ser sintomático da falta de ideias para mobilizar. Se dessem soluções, e não mentiras, o povo não se interessaria pela política?

Apesar das fraquezas da carne e da necessidade, ainda acredito na democracia por não haver meios suficientes que a comprem. Caso contrário, teríamos, em vez de um regime político vocacionado para o atendimento das condições económicas, sociais e culturais, um grupo de patos absorvidos pelo comércio de poder, exclusivo da elite dominante, em tudo o que cria riqueza e que concebe um povo sereno e grato na pobreza.


Diário de Notícias do Funchal
Data: 22-04-2017
Página: 25
Link: Medo e dependência

Clique por favor para ampliar o recorte de imprensa:

sexta-feira, 24 de março de 2017

Empreendedorismo Político

Da designação Empreendedorismo Político deriva a sigla EP, apesar de conferir, não confunda com Empresa Pública, entidade que vive à sombra do erário e da oportunidade pública. A primeira dá sempre lucro, a segunda nunca sai do buraco financeiro.

O Empreendedorismo Político (EP) é um fato à medida com sucesso assistido e garantido. Negócios, cadernos de encargos, concursos, regras e leis, contratos, fuga legal aos impostos, subsídios, nomeações, adjudicações directas, aniquilação da concorrência, tudo à medida, até secretárias com as medidas. O EP vive no Jardim do Éden, sem fruta proibida. Dizem, a sorte constrói-se, pena não termos todos um pouco de poder, em vez de deixados à sorte por uma democracia representativa capturada por uma dúzia. Enquanto impotentes observadores deste abuso, resta-nos desejar que a facturinha da “sorte” não chegue a casa.

O EP usa o capital político, a informação privilegiada e o erário público, embrulhado no interesse ou necessidades do povo para fazer fortuna. Cega até atingir a bronca mas há sempre um bom advogado conhecedor das brechas da lei e da justiça com uns testas de ferro que, ora ganham uns cobres ora são o elo fraco. Todos sabemos, sem prova oficial, na mesma proporção do fogo do Verão passado, tudo controlado mas calcinado.



Os EPs dependem da política, porém, a maioria é incapaz de conquistar votos e muito menos de serem cabeças de lista mas, pelo império, estabelecem submissões por dívidas de favores no sistema. Muitas das ilusões de subir a pulso acabam com os seus nomes, recebem as maiores atenções para o acesso a lugares elegíveis à boleia da cara dos outros. Pagam o que for preciso, a democracia também é um negócio. Quando suspeitam da eficácia dos líderes, fornecem engodo ao povo, um investimento tipo mecenas que logo recuperam. Nos momentos quentes lutam selvaticamente para não perder o estatuto, eixo giratório do império e da importância. Odeiam gente com coluna vertebral, preferem moluscos. Se falham, tornam-se uma nulidade, arrepia-lhes muito viver como um cidadão comum. Qualquer catedrático descerá à categoria de tonto, ressabiado ou invejoso quando, em matéria que domina, interferir nos supremos interesses de um EP. Depois de instalados, dividem para reinar e minam a credibilidade dos sérios. Manipulam a realidade com ares de genial moralista, alguns dão conferências que doutrinam o sistema a seu gosto escondendo as vantagens obscuras de que usufruem para serem ícones do sucesso. Por tudo isto e muito mais, usar capital político para abrigar EPs devia dar cadeia. São estes que renovam os ciclos das mesmas castas de EPs para desfrutar do seu momento, também de cobrança, não se importando com o colapso dos partidos tradicionais, desde que servidos.

Dos EPs nasce a proliferação de incompetentes, válidos como excelentes bufos, cães de guarda, sem valores ou ética mas que levam as clausuladas boas avaliações nas hierarquias da governação, descredibilizando as instituições e desmoralizando os funcionários. Ocupam simplesmente o lugar, alguns nem precisam de ir ao emprego. Os EPs de elite passeiam-se com as mordomias do Estado que lhes deixam o ordenado intacto, dizem conhecer o sofrimento do ordenado mínimo, no adro, se tiverem que ser convincentes até lêem a epístola. Em Roma sê romano.

Quando toda a economia se desterra pelas falências promovidas pelos insaciáveis EPs, são estes que, na maioria dos casos, comparecem ao “abutricídio”, um jogo de bens do infortúnio sem dono onde se praticam valores por palpite respaldados por um sorriso sacana. O império cresce barato e a gosto, supervisionado por um esquema zeloso a penhorar e estrábico a vender. Usadas todas as potencialidades do sistema, se ainda assim o EP for aselha e perder num enfrentamento político, depois de distorcer o mercado e a política, alguns ainda levam subsídio de reintegração enquanto o comum empresário, confrontadas todas as vicissitudes, nem a subsídio de desemprego tem direito. Com estrondoso sucesso que catapultava qualquer governo ninguém promove o EP Valley nem faz algazarra com as Startups dos EPs.



O eleitorado encara tudo isto sob um silêncio cada vez mais cínico, destruindo sondagens, alguns indo aos jantares de todas as cores, outros cedendo ao populismo. Os EPs estão a construir sociedades exclusivas, o tempo esclarece e mata o discurso. A apropriação da democracia representativa pelos EPs, enquanto forma de negócio, deve promover no eleitor o fim da fidelidade partidária e não o desejo de participar no banquete que, não chega para todos nem os EPs querem repartir. Todo o espectro político deve ser válido enquanto opção para atingir os fins no interesse do povo-eleitor, honrando os sérios. Esta é solução antes que nos deparemos com um boletim de voto armadilhado, à semelhança de alguns concursos, com várias propostas do mesmo interesse. É necessário olhar para toda a lista e não só para o cabeça de lista. O eleitor deve criar exigência deixando opções credíveis em aberto, a qualidade só surgirá se os partidos souberem que não podem prevaricar e não alcançarão, sob qualquer forma, o poder. O objectivo dos EPs é confiná-lo ao voto por necessidade ou exclusão de partes, mesmo que a parte beneficiária não valha mais do uma aposta empresarial. Adoram a rendição do eleitor pela abstenção, os interessados votam sempre. Devemos obrigar os partidos tradicionais a purgar os EPs das suas nomenclaturas para que se invertam as respostas a duas perguntas: O eleitor melhora a sua vida? Não! O EP melhora a sua vida? Sim, trabalha no interesse pessoal em cargo público!

Os EPs parecem ETs, não ligam à humanidade quando o dinheiro ao seu serviço faz falta em tanto lado. E porque do curriculum dos EPs consta que os líderes passam e eles ficam, o silêncio dos cidadãos diz-me que o  eleitorado vai actuar pois os EPs ainda não são proprietários da democracia.




Diário de Notícias do Funchal
Data: 25-03-2017
Página: 25
Link: Empreendedorismo Político

Clique por favor para ampliar o recorte de imprensa:

sábado, 25 de fevereiro de 2017

Eduardo mãos de tesoura

ábado Gordo, o calendário chinês decretou o fim da macacada rumo ao “ganda” galo, alvitrando que 2019 vai dar no porco com um “ah cão” em 2018. O humor com belos disfarces aprecia o cortejo alegórico, os enredos e as respectivas batucadas. Arranca o Carnaval 2017.

Samba Enredo do erro político: Eduardo invocou no início do mandato uma indemnização adiando mudanças num dos problemas da região, os portos e seus custos. O presidente do governo disse que não fazia saneamentos políticos mas o que estava em causa era o superior interesse da região para avançar com novas políticas. Mexer no modelo de exploração dos portos é urgente mas uma bomba relógio, a falta de lucidez pode contar com confusões eleitorais. Se não cumprir, falha uma promessa eleitoral, se houver meia solução perante o discurso de ruptura dará polémica, se renegociar com o lobby este naturalmente defenderá os seus interesses. Então é preso por ter e não ter cão? Exactamente! Mas há um pormenor, o timing! Um político planificava as acções fracturantes para o início do seu mandato. São estas as palavras que contam: “Não podemos ter um dos portos mais caros do mundo, não há qualquer justificação para os preços praticados nos portos da Região”. Fazer estágio técnico num governo é um luxo, o político é mortal.


Samba Enredo do novo mandato da APRAM: a missão é titânica mas poucos estão conscientes, talvez por isso a administração seja composta por 2 disfarces de Titanic e 1 de rebocador. A comunicação está pior e não augura nada de bom para a transparência a nível interno e externo. Da opção por uma financeira para liderar a APRAM deve resultar, pelo menos, na cobrança das dívidas a operadores e agentes portuários, disciplinar a facturação e a cobrança da actual operação ferry e demais inquilinos. A APRAM deve dar lucro.

Como vai a APRAM defender os interesses da região dos tentáculos privados? Como vai actuar perante os apetites de privatização de áreas sob sua tutela que prevaricam as certificações dos cais? Se vamos ter ferry Madeira-Continente, quais as regras que garantem o uso da rampa Ro-Ro? Continuaremos a dar mais área de estacionamento a um restaurante do que aos movimentos dos passageiros do ferry? Esta administração findará a falácia onde se situa o debate político sobre o conceito de ferry para condicionar os resultados? Qual o plano anti decadência nas escalas de cruzeiros? Vamos ter promoção, visão conjuntural e prestação de contas das iniciativas realizadas? Estando a economia à mercê de um oligopólio que sufoca a economia prosseguirá pelo mesmo caminho nas marinas e nos estaleiros? Em que condições ocorrerá a ampliação do molhe da Pontinha? Vamos ter mais falhados em obras marítimas? Estará a presidente da APRAM consciente de que a cidadania madeirense pode intervir nos portos? Foi escolhida por ter um programa? Uma entrevista com compromissos é urgente, de preferência em directo.


Samba Enredo da iluminação de Natal: percamos o instinto de ilhéu que compara consigo no ano anterior, comparemos com outros destinos concorrentes. Temos de criar ornamentação e não colocar iluminação, usar tecnologia e não colocar tecnologias. Deixamos de produzir os nossos desenhos para importar “pré-fabricados” por catálogo. O Funchal deve ser segmentado por áreas e entregues a artistas que produzirão ornamentos originais. Devemos restituir o nosso legado de Natal às iluminações e materializar a nossa singularidade perante destinos concorrentes. Devemos acabar com os investimentos em iluminação para colocar no chão, sem impacto visual e que não se projectam nas fotografias, devemos optar pelos postes temáticos que decoram, criam luminosidade e ambiência de forma mais eficaz. A zona hoteleira deve ter a mesma atenção que a baixa. Deve-se guardar o que melhor resultou para uma área vintage nos anos seguintes, conceber um bom mercado de Natal que inaugurará integralmente as iluminações de Natal a meados de Novembro para captar turismo nessa época baixa. Centralidades como a Avenida Arriaga não devem substituir ornamentação por motos de vendas, devem coexistir. Os operadores de imagem devem ter opinião na concepção pois garantem a imagem que vamos vender. A iluminação em gambiarra com lâmpadas LED pelas ruas do anfiteatro ganhou nova vida, só temos que cobrir áreas negras para equilibrar o conjunto. Estamos a viver da fama, num enclave de notoriedade a executar erros. Quanto ao anunciado Festival da Luz, não será uma novidade para os turistas europeus, esperemos que não seja mais uma cópia.


Samba Enredo do fogo da passagem de ano: a frente de postos de fogo deve regressar à Avenida do Mar criando uma densidade que agracia a afluência à baixa e garante aos navios de cruzeiro uma melhor vivência do espectáculo. Contraria a redução da visibilidade provocada pelo fumo e melhora a integração da componente das explosões. A perspectiva dos navios é essencialmente cénica, o ruído dissipa-se conforme o afastamento da baía e este é um componente da pirotecnia no final institucionalizado. A frente de fogo dá consistência à recolha de imagens, as capturas integrais são difíceis, essa dádiva é para desfrutar presencialmente. Nunca estará pendente do estado do mar. Se os minutos diminuem para manter o ritmo de fogo, não podemos ao 4º minuto perder a cadência do apoteótico.




Diário de Notícias do Funchal
Data: 25-02-2017
Página: 27
Link: Eduardo mãos de tesoura

Clique por favor para ampliar o recorte de imprensa:


quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Deus e eu


rente a frente. Adorá-lo ou Desafiá-lo? Como entidade de bem não levará a mal um exercício de dúvida. Será que olho para Ele nos olhos? Será um ser, uma luz, uma metáfora, uma mandala, uma consciência, um valor ou uma ética? O que finalmente será?

Enerva aquele modo de Ser que encerra em nós as perguntas e as respostas, um monólogo em presença de dois com todos. Se vê, ouve e sabe tudo só poderei jogar com a verdade nos limites da compreensão humana. A verdade com Deus é como uma arma de dissuasão pela positiva, não haverá um passo em falso sem ter a certeza. É incrível que haja esta solução e ninguém a tenha usado. Deus parece aqueles que nunca perdem a razão porque nunca vão a votos. Será? Que silêncio.

Não será naïve jogar honesto para perder quando outros jogam sujo e ganham, ficando com a razão e a importância através da vitória suja? Se vitórias assim ditam as regras, como pode o mundo triunfar se o mal é tão fácil e o mérito tão desafiante na complacência do próprio Deus? Será que Deus é uma matriz de consciência que surge com a evolução do ser humano? Existe enquanto tivermos consciência ou existência?

Custa ter coragem de reclinar o olhar e finalmente ter a certeza de que existe quando sentimos tanta injustiça, quando parece que os piores ganham sempre e que os males afectam só a boa gente. Será que notamos o benefício dos maus e omitimos o dos bons? Será de novo a consciência? Onde acaba o sentimento e começa o pecado?

Como responderia Deus aos desafios dos maus materializando a sua presença na Terra? Penso em momentos da história universal que nos poderiam ter levado ao extermínio se o bem não lutasse com maus modos. Imagino a Segunda Grande Guerra, com os bons a lutar com as palavras e não com armas, como ganharíamos à besta? Não teremos vencido por via do pecado para alcançar o bem? Proponho um desafio, ver as suas soluções em aulas práticas. Há uma condição, teria que actuar como ser humano, sem truques. Será que Deus na ausência da harmonia e da perfeição, na presença de toda a maldade deste mundo, também perderia as estribeiras? Chegaríamos ao limite da legítima defesa para cometer um pecado inimputável? Seria prova da Sua imagem e semelhança em relação a nós? Só me lembro do sofrimento de Cristo e o que disse na cruz enquanto homem. Somos experiências de Deus para alcançar a perfeição?

Como ser perfeito, supremo, infinito, a causa primária de tudo mas também o fim das coisas, Deus nunca esteve sujeito a um início onde decorre o espaço, o tempo, a matéria e o transcendente. Se nascemos mas nunca temos fim, passando da matéria para o espírito e Deus é a origem, onde somos a imagem e semelhança, qual a génese do Criador? Se Deus é a origem de tudo como existe Deus e o conhecimento? Será que regressamos, de novo, à matriz de consciência onde Deus derrama a evolução do homem nesta imensidão do universo? Deus é autodidata ou faz experiências connosco?

Somos os únicos à Sua imagem e semelhança no universo? Porquê só nós ou porquê tantas imagens e semelhanças? Porque a fé é profusa em metáforas num labirinto que nos impede de chegar a ideias claras? Para criar o mistério da fé? Porque temos tantas perguntas ao fim de tanto tempo?

Num mundo com tantos deuses, muitas vezes fonte de discórdia, porque terei eu o original e os outros não? O meu Deus não sucumbirá como os deuses dos egípcios, dos gregos, dos astecas ou por acção da ciência? Porque ficamos instantaneamente devotos quando a ciência falha ou não é suficiente? Deus existe porque precisamos de acreditar, nos referenciar em algo e ter a resposta universal quando desconhecemos?

Por vezes agoniamos tal como seu Filho na cruz e ficamos a pensar se sente, apesar de ter criado o que, por vezes, estes terrenos sentem de dor e injustiça.

O leitor é crente por fé, por devoção, por via das dúvidas, não vá o diabo tecê-las ou só quando está aflito? Porque é que sendo uma questão para se levar muito a sério há muitos intermitentes na sua fé? Porque é que se a fé salva o espírito para todo o sempre somos tão humanos, com defeitos e virtudes, no dia-a-dia? O que falha em algo tão imprescindível?

Que certezas ficam? Deus é um enigma que cada um assume com maior ou menor profundidade, para distinguir o bem do mal, e nos transportar do plano material da nossa dimensão humana para a espiritual? Deus faz-nos viver pelo melhor prisma da humanidade? A Sua existência serve para nos provocar a dúvida e termos a humildade da pequenez na imensidão do desconhecido? Será que é a dúvida sobre Deus que nos faz melhores pessoas? Se a humanidade falhar será à sua imagem e semelhança? Se Deus exerce efeito, existe? Como? A descoberta é a missão da vida.

Caro Deus gostei muito deste bocadinho, agora que virei do avesso a fé, as consciências ou existências, deixo-te por afazeres terrenos. Abana esses Santos acomodados porque vivemos tempos desafiantes onde a descrença substitui a dúvida. Dizem que o Padre José Luís convidou o Trump para um “Deus e eu”, vou ver como te desenrascas! Já percebeste que é mentira, pequei por uma boa causa, a de desafiar-te a ser melhor Deus. Que heresia.


Blog "O banquete da palavra": Deus e eu
Facebook: Hoje "Deus e eu", com Carlos Vares ...
Nota: Texto exclusivo para o blogue "O Banquete da palavra" da autoria do Padre José Luís Rodrigues.

sábado, 28 de janeiro de 2017

Porque definha o PSD-M?

poder, em democracia, não é estatuto que manipula a realidade, é contrato a termo certo assinado por uma maioria em favor de políticos que se tornam governantes, aos quais se exige postura intelectual e executivamente isenta na prestação exclusiva de serviços ao eleitor e na protecção do bem público.

A maioria que assinou o último contrato nas Regionais, em  benefício da dúvida, detectou que a linguagem forte de ruptura usada foi uma estratégia e não um compromisso. A convicção foi selada no passado fim de semana onde um destacado militante proferiu a frase “nunca houve ruptura entre o novo e o velho PSD”. No congresso de “união”, os seguidores/militantes de base ostracizados observaram este jogo de espertalhões que lhes confere a culpa do passado. No eleitorado surge a pergunta: - para que foi todo aquele circo das Internas e das Regionais?

Renovar significa, nesta altura, obras de “beneficiação” sobre uma mesma base. O PSD-M reprovador da Madeira Velha é o partido do “filhismo”, a oportunidade encerrada, premeditada e guardada para o filho ou filha de fulano tal. Depois segue-se o “amiguismo”. Não é natural que o PSD-M mingue? Que as famílias falidas pelo PSD-M o abandonem e outras instruam seus filhos a partir, ainda durante os estudos, para uma terra de mérito e oportunidade livre?

PSD-M está apinhado de generais com pés de barros
sem soldados rasos de alta patente.

A dificuldade em conseguir candidatos vencedores para as Autárquicas prova que o PSD-M está apinhado de generais com pés de barro sem soldados rasos de alta patente. Nalgum tempo, um candidato era uma “instituição” respeitada com apoiantes à partida. O PSD-M está num momento onde os valorosos se resguardam para não apanhar, de novo, com as culpas, e os menos cotados acreditam na oportunidade. O que se vê no governo vai chegar às autarquias. Os problemas não começam em Lisboa, nos Directores Regionais, nos apelidados por ressabiados, os problemas arrancam nos líderes por injustiça. O PSD-M não respeita há muito tempo o mérito e a selecção natural. Os actuais líderes já pensaram na história que estão a escrever e nos novos líderes que promovem para o futuro? As opções e prioridades definem os líderes. Se a matéria prima é fraca, os métodos então valha-nos Deus. Depois de um arranque de maus feitios, da demonstração de impreparação para lidar com o poder e dos perfis falsos nas redes sociais, surge o curso de comunicação para saber lidar com o povo. O congresso encerrou a formação com “é preciso ir à tasca beber um copo e ouvir o sino da igreja”. Governar bem evita uma carga de trabalhos. O final do congresso poderia ter sido apoteótico, com o presidente da mesa a insistir na união e umas imagens das ribeiras do Funchal a passar em fundo. Os congressistas levantavam-se e pediam a sua candidatura às autárquicas pelo Funchal, para também roer os ossos. Líderes são exemplos que se generalizam.

Antes de chegar ao povo, o PSD-M tem que satisfazer uma enorme clientela que deixa pouco espaço ao trabalho sério que resulta em reconhecimento. Assim se explica o clima de crispação por injustiça e consequentes maus ambientes de trabalho sobretudo na função pública. O facto de que quase tudo o que se dirige ao povo sai mal, em contraponto com extremo acerto nas concessões aos lobbies, gera incredulidade e intolerância. As lideranças do PSD-M vão produzir, de novo, um mau ambiente eleitoral aos seus candidatos autárquicos.

Cafôfo independente, mesmo usando um “veículo”, mais do que a oposição acomodada que não quer agarrar a oportunidade (a que gosta de regalias sem compromissos), corporiza um activo em observação pelo eleitorado que tende a lhe dar a mesma força com condescendências que muitas vezes concedeu a um PSD-M errante. As recentes sondagens dão conta que Cafôfo se está a tornar numa “reserva territorial” para os munícipes do Funchal que, no futuro, não terá influência exclusiva na capital. Mesmo com o resultado das sondagens, algum eleitorado esconde a intenção de voto contrária ao PSD-M devido aos seus maus fígados na hora da derrota. O que há de incógnita molestará mais o PSD-M. O compromisso de alterações profundas invocadas para ganhar as Regionais, não notadas até ao momento, trazem novo problema ao PSD-M. Quando menorizam as prestações de Cafôfo porque compra muita publicidade ao Diário de Notícias, fica uma pergunta usando a mesma lógica: - porque não está o PSD-M igualmente popular em iguais circunstâncias? Quando acusar, deverá ter argumentos abonatórios.


Porque definha o PSD-M? Por falta de se dar ao respeito e respeitar, de sinceridade, de sentir a dignidade das pessoas, de ideias liderantes, de valores, reputação e de ética, de rumo sem sectarismos.

Porque definha o PSD-M? Um bom político não é um instantâneo ou um protegido. Deve fazer escola desde as bases, passar por várias etapas de gestão, saber lidar com as pessoas e seus feitios; saber falar em público, em bom português; coordenar ideias de improviso; ter etiqueta, dominar protocolos, ser distinto e exemplar; capaz de gerir interesses, os tempos e os humores; lidar sinceramente com o povo sem ver um voto ou uma cor. Deve ultrapassar desafios e ter idoneidade. Não deve estar conotado em causas próprias. Quando apto, terá uma oportunidade e não um oportunismo, será governante para actuar com carisma e know-how.

O porta-voz de um partido ou de um governo não pode ser qualquer um, o espertalhão, o intragável, o vendido, o intelectualmente desonesto, o desprovido de mérito e sem pingo de vergonha, o das verdades oficiais que ferem a inteligência; o que não se prepara mas é pretensioso, julgando que engana o eleitor. Há falta de categoria e de profissionalismo.

Se os congressistas queriam ouvir falar de autárquicas, o povo queria ouvir falar de si. Ninguém saiu satisfeito. Em artigo anterior considerei 3 momentos para o PSD-M mudar, já falhou dois, quererá positiva no terceiro período?

Diário de Notícias do Funchal
Data: 28-01-2017

Página: 28
Link: Porque definha o PSD-M?


Clique por favor para ampliar o recorte de imprensa:

sábado, 31 de dezembro de 2016

Facto do ano: Ribeiras do Funchal

génese
O 20 de Fevereiro provou a robustez das paredes de basalto, com mais de 200 anos, dos encanamentos das 3 ribeiras do Funchal. O seu enchimento com detritos sólidos trazidos pelas enxurradas provocou o transbordo das ribeiras e as correntes distribuíram-nos livremente na baixa da capital. Paralelamente, o nível do mar subia. Ficamos elucidados sobre a capacidade dos movimentos das vertentes das ribeiras para alimentar a aluvião. As obras da Lei de Meios respeitaram uma parte do Estudo de Avaliação do Risco de Aluviões para o Funchal. Os açudes em betão a montante foram uma boa opção que, ainda assim, pode gerar discussões sobre o espaçamento que só recolhe pedras com um diâmetro superior a um metro. Serão capazes de segurar o volume de detritos sólidos que vimos no aterro que esteve na frente mar?


Agudização do problema
Após os grandes incêndios no Funchal, a cidade repete a conjuntura de calvície das suas montanhas na aluvião de 9 de Outubro de 1803. Expuseram a fragilidade da argumentação dos que defendem o revestimento das paredes de basalto das ribeiras e derrubam património histórico edificado em bom estado. A obra não é uma solução, é uma agressão, o seu efeito será residual perante a capacidade de débito da matéria sólida constitutiva das aluviões dos vales, agora ainda em pior estado, sobretudo em troços fundamentais como o Viveiros - Fundoa e a norte do Campo do Marítimo. Invocar a segurança para silenciar detractores é um registo para memória futura, ambos têm a mesma preocupação mas por caminhos diferentes. Neste momento, mais do que uma consciência é um negócio. O esforço financeiro deveria estar consignado à reflorestação para fixar terras por indicação do supremo estudo que o 20 de Fevereiro forneceu. Financiada pela UE em 85%, nos termos do POSEUR, a obra não teve um Estudo de Avaliação de Impacte Ambiental independente e atravessa o coração histórico da cidade em zona de protecção legalmente estabelecida, só foi possível porque o Governo decidiu em causa própria.

A gestão política
A decisão da obra com a respectiva justificação técnica, orçamentação e apoio comunitário, têm origem no mandato anterior e é parte de uma narrativa maior que se estende aos nossos dias. No passado, a solidariedade institucional não abria brecha política, a incompetência tinha seguro de vida. Na actualidade a culpa acaba no “mexilhão” e a cúpula hierárquica entrega o erro pronto-a-consumir sem remetente. Quando o PSD-M, em Conselho Regional, ensaiou um culpado para a má governação, ameaçando com o afastamento quem obstaculizava, julgo que a maioria dos madeirenses sorriu. As décadas de governação do PSD-M instituiu a ideia de que ninguém se candidata a perder o emprego, tudo segue os ditames da vaga do momento. O problema não será exactamente ao contrário? A submissão aos interesses empresariais e políticos.

Foto de Danilo Matos


A Opinião Pública
O único bloqueio com origem numa avaliação desinteressada teve origem na Opinião Pública, com fundamento técnico e por cidadania numa rede social. Onde estiveram os deputados a debater as ribeiras na ALR? Qual o esforço do Ambiente e Recursos Naturais perante este despesismo para alcançar maior orçamento para a reflorestação? A CMF fez tudo o que devia? Os pareceres dentro do governo foram idóneos?

Mediador suspeito
Com a popularidade em queda e a contagiar o governo, o secretário da tutela surgiu em postura de mediador, até então ausente e inocente mas que deu início às obras que transfiguram a cidade. Usou uma interpretação da conjuntura que o iliba, incutindo bom senso aos projectistas da obra para se conciliar com o aceso debate público. A obra veio do passado e passou a ser coisa do futuro sem presente. A contenção política, verbalizada na suspensão do projecto para o trecho da ribeira de Santa Luzia entre o Bazar do Povo e a Ponte D. Manuel, não foi suficiente e só serviu para criar mais desconfiança e dúvidas. Em postura de Pilatos, foi politicamente irresponsável, orçamentalmente abusivo, tecnicamente doloso e historicamente um sismo.

A agravante

Como é que um secretário regional que lidera partidariamente um Gabinete de Estudos, órgão supostamente aberto à sociedade civil, consegue omitir opiniões válidas e ter a Opinião Pública contra? Onde reside a força de bloqueio que destrói a imagem do governo? Envolver traz consensos mas, cada um sabe dos seus propósitos.

O futuro
Quando os tapumes forem retirados estará consumada a dimensão e o impacto da obra. As Buganvílias, outro ícone do Funchal, será passado. Com a aceleração das correntes, ao chegar à entrada e ao interior da Pontinha, vão provocar ondas de fundo que afectarão as manobras de acostagem e amarrações dos navios. Enquanto não se segurar a montante, as ribeiras serão, tão só, sarcófagos dourados. Entretanto, a actividade económica junto às ribeiras ou ocupando os leitos naturais prosseguirá. Estamos a compilar uma série de erros que vão incrementar despesas fixas de manutenção e desassoreamento com calendário estabelecido.

sábado, 24 de dezembro de 2016

Promoção de Laranjas

poca de laranjas com o diabo na casca e também de sermão, levadas, quase dadas, sempre com cartão. Provêm das quintas, as da casa, essas coitadas, já não servem a tradição. De preferência com etiqueta e bom nome para dar elã, quase gourmet a caminho da Michelin. Se a variedade ainda assim engana, por culpa da apresentação, quando não verte sumo fica em xeque a cunha e a apelação. Ai, ai, ai, fotógrafo do engano zelando pela agremiação, paga-se um preço tão alto por este custo de produção.
O chefe de família apronta-se à saída de casa, é o momento da verificação, chaveiro, telemóvel, óculos para a falta de vista e acaba-se a reflexão, essa tantas vezes importunada por vozes em cornetão, cá vai mais uma que dispara: - NÃO TEMOS LARANJAS, COMPRA COM CARTÃO! Quis comprovar no “lençol” mas esse forrava a gaiola do rouxinol. O gato, ícone da casa, sempre prostrado em posição esquisita, lança uma pata sobre as orelhas e outra sobre a visão. Calem-se avisos estridentes da reacção, ele não quer saber da promoção, bem, só hesita se também tiver ração.
Chegado aos frescos, banca das laranjas, qual púlpito virado para um congresso, eram de facto imensas, de pôr os nervos em franjas. Sem cor uniforme isto vai ser uma maçada, escolhe-se conforme, bum bum avança a caçada. Da intensa cor uns vêem laranjas, outros abóboras, a alguns sabe a mel silvestre, para os mais indecisos, é tipo Kompal, é um manga-laranja, pende para o lado do maior arraial. Vale tudo, algumas colocam-se vistosas como que a dizer: - se me apalpas … levas-me. Ai a tentação. Retirou a embalagem que descoseu pelo picotado, coisa frágil para a quantidade que enche o saco. De frente para as laranjas sentiu-se jota, quando já vai cota, e traça o rumo nesta vivaça e pueril banca apanhada verde para o consumo. Que saudades de uma boa fruta caseira, apanhada no tempo certo para o presépio de escadaria, esse que nem dá canseira, mas onde o gato não larga a frutaria.
Esperto, o chefe de família começa por cima, distribui mas igual fica, ao apalpar arrepiou-se, estavam gélidas da câmara, a frigorífica. Terminada a transferência de calor apalpou com mais vigor e pressentiu, são das secas Senhor! Meteu no saco respeitando a boa ética, de não apalpar e deixar ficar. Com a experiência obtida foi a outra tonalidade, sempre com as primeiras em cumplicidade. Ao retirar aquela, especificamente, veio outra que amparou com o cotovelo, ai que dores quando chegam ao mesmo tempo. A posição não era ortodoxa mas ninguém viu, os tempos não andam católicos, psiu! Safou-se, e de novo com boa ética meteu a segunda no saco, somou experiência precisando do ábaco. Agora é escolher da mesma tonalidade, contudo as melhores são das mais profundas e decidiu-se por outra variedade. Ao retirar, deslizam sete ou oito para o outro lado onde também há biscoito. A terceira não era má mas agora começa o problema da fartura, decidir qual de tanta apanhadura? Enquanto a quinta mingua, por opção, o baldio aumenta com a selecção.
A pomologia diz-nos que há-as com umbigo enorme, atasca a máquina e não verte sumidade; sem pevides, consome-se mas, dali brota nicles; de casca grossa, viçosa mas com gomos palha; com nome pomposo, das que chamam a atenção mas, azedas que até apertam a tal visão.
Existe até a variedade “sanguínea”, laranja por fora mas vermelha por dentro. Há outra chamada canalha, da prateleira não tenho ideia, faz-se um bolo sem falha, sai lindo do forno para admiração da assembleia, aplica-se o sumo, afunda a sobremesa, que tristeza, só me faltava a diarreia.
E a cimboa? Mais do que um ornamento, uma delícia! Combina a forma da laranja com a cor do limão, sem malícia, dá um porta-enxerto de assombrar, apesar de saborosa metade é para descascar. Que escolha faz este supermercado, com tanto doutor e engenheiro sem escola, em gabinete a estudar? Pomologia rara que despreza como fruta “feia”, quando sumarenta, é de pasmar!
A odisseia prossegue, a mãozinha viril lá foi à fruta queque, que ideia imbecil! O mundo desaba-lhe, por sorte, na anarquia das roliças, só uma sobrou para as hortaliças. Estrelinhas esvoaçam e anjinhos tocam harpa, está feita a ornamentação, finalmente se percebe o que é Natal com um safanão. O obstáculo não cunhou a bicha que se estatelou, foi ao chão. A falta que fazem duas mãos ocupadas na fruta. O talude cede mas está tudo controlado, desde que se mantenha de quatro. Olhando para cima, pânico! O ananás com imponente coroa a perder alicerces. Pelo amor de Deus, aguenta-te. Deitado e espalmando, qual vibrador de laje tirando bolhas de ar, vai observando a laranja derrotada, a que caiu, a rolar pelo chão. Que triste fim da produção. Levará um coice espremida pelo carrinho em contramão ou alguém civilizado apanha com a mão? Não! Voltou o desassossego dos grisalhos com o laranjal, a velha ficou na horizontal. Que faz ela aqui se temos a inclusão em festival?! Raios partam a velha mas, tratem-na com carinho e atenção, não estraguem a promoção. Lembrem-se, a laranja caridosa sacia a pobreza viciando a condição.
Em tão pouco tempo a nova remessa esgota, que grande sucesso esta promoção, a altiva cúpula desbota, as laranjas são levadas, de uma a uma, pela mão. É chegada a hora da laranja-cenoura, uma bebida de eleição, quando faltam as primeiras acenam-se com as últimas, mantém a folia, parece um presentão.
Mais um ano passado, sempre a mesma conclusão, com tremendo enfado, o que nos vendem é ilusão. Fazemos figura de pato, com laranja, para manter a tradição.
Enfiado, o chefe de família assoma-se ao balcão: - nem que talhe, quero um batido de limão!



Diário de Notícias do Funchal
Data: 24-12-2016

Página: 27
Link: Promoção de Laranjas

Clique por favor para ampliar o recorte de imprensa: